Por BRUNO MOTTA

SERÁ QUE OVO É SAUDÁVEL?

Com certeza, uma das perguntas que eu mais recebo dos meus pacientes e também de quem me acompanha nas redes sociais é:

“Bruno, ovo é saudável ou aumenta o colesterol?”

Como eu sei que essa é uma dúvida de muitas pessoas, resolvi escrever esse artigo para esclarecer esse assunto e passar algumas informações importantes sobre a composição nutricional do ovo e o impacto que esse alimento gera no nosso organismo. 

E pra começar a falar sobre esse assunto, é essencial que você entenda quais são os nutrientes que estão contidos em cada parte do ovo.

“Ovos enriquecidos com EPA + DHA (através de óleo de peixe) são mais benéficos e nutritivos, mas como o sabor e o cheiro desses ovos são mais fortes, eles acabam sendo menos procurados pelos consumidores.”

ALBUMINA (CLARA)

A albumina, nada mais é do que a clara do ovo. Essa parte é constituída, principalmente, por água e por proteínas.

Além das proteínas, essa parte do ovo, também contém uma ótima quantidade de algumas vitaminas do complexo B, como a biotina.

Só que na constituição da clara, também contém avidina, que é um tipo de proteína que pode prejudicar a absorção de outros nutrientes importantes que estão presentes no ovo, como as próprias proteínas e algumas vitaminas.

Felizmente, uma porção considerável da avidina é destruída durante o aquecimento do ovo (incluindo o processo de pasteurização), e com isso, essa perda nutricional é reduzida de forma bastante significativa.

GEMA

A parte amarela do ovo, que é conhecida como “gema”, é constituída principalmente, por gorduras.

Cerca de 46% da composição lipídica é ácido oleico, que é um ácido graxo monoinsaturado que também está presente no azeite de oliva e é mais conhecido como ômega 9, 38% de gorduras saturadas e 16% de gorduras poliinsaturadas (PUFAs).

A proporção com relação a quantidade de gorduras polinsaturadas de cada gema, vai depender muito do modo em que as galinhas são criadas.[1]

Como a maioria das galinhas é alimentada com grãos ricos em PUFAs ômega-6, os ovos normalmente, são muito mais ricos em PUFAs ômega-6 do que em ômega-3.

Já galinhas que são alimentadas com pasto ou com um ômega-3 especial, dão origem a ovos com uma proporção de gorduras polinsaturadas mais equilibrada com relação a proporção entre ômega-3 e ômega-6.[2]

Esse equilíbrio é bastante importante, tendo em vista, que o ômega-3 é um tipo de gordura super importante pro nosso organismo por possuir características antiinflamatórias.

Já o ômega-6, é um tipo de gordura, que quando consumida em maior quantidades, acaba estimulando o aumento dos processos inflamatórios no nosso organismo.

O ácido alfa-linolênico (ALA), o ácido eicosapentaenóico (EPA) e o ácido docosahexaenóico (DHA) fazem parte do grupo de gorduras denominados: ômega-3. Eu explico mais detalhadamente sobre os tipos de ômega 3 nesse post

No nosso organismo, o ALA, que é um tipo de ômega-3, se converte em EPA e em DHA, que são os tipos mais ativos, só que essa conversão não é muito eficiente e reduz cada vez mais conforme vamos envelhecendo.

Sendo assim, consumir alimentos ou suplementos que sejam fontes de EPA e DHA, nutricionalmente falando, é mais interessante do que consumir fontes de ALA.

Eu falo isso, porque a maioria das galinhas que são alimentadas com uma ração rica em ômega-3 recebe ALA, e não EPA e DHA.

O teor de ômega-3 das gemas pode ser aumentado alterando a alimentação das galinhas por meio de suplementos de ômega-3 na forma de ALA ou EPA + DHA.

Ovos enriquecidos com EPA + DHA (através de óleo de peixe) são mais benéficos e nutritivos, mas como o sabor e o cheiro desses ovos são mais fortes, eles acabam sendo menos procurados pelos consumidores.

Por isso que, somente um número menor de galinhas que recebe ração ou suplementos com óleo de peixe, que contém EPA e DHA, que são a forma ativa do ômega-3.

“A gema é composta principalmente de ácidos graxos, colesterol e nutrientes solúveis em gordura, mas apesar de ter menos proteínas do que a clara, ela contém concentrações mais elevadas de leucina, que é um aminoácidos essenciais mais importantes pro nosso organismo.”

As gemas também têm altos níveis de carotenóides (principalmente luteína e zeaxantina), que são capazes de elevar as concentrações de carotenóides no nosso plasma sanguíneo [3], e em tecidos específicos, como os nossos olhos. [4]

Além disso, as gemas estão entre as fontes mais ricas de colina, que é um nutriente capaz de proporcionar uma série de benefícios para a nossa importantes para o nosso organismo. [5]

E, apesar da gema conter menos proteína do que a clara, ela possui concentrações mais altas de um aminoácido essencial super importante, que é a leucina.

COLESTEROL

O colesterol é uma substância parecida com a gordura e está presente em todas as nossas células.

Ele serve para diversas funções, como fornecer matéria-prima para a pregnenolona, que é um hormônio obtido a partir da conversão do colesterol, da qual são derivados diversos outros hormônios super importantes pro nosso organismo, como por exemplo, o cortisol, o DHEA e a testosterona.

O colesterol é transportado pelo nosso organismo através de dois tipos de transportadores feitos de gordura por dentro e de proteínas por fora, que são as lipoproteínas de baixa densidade (LDL), frequentemente chamadas de “colesterol ruim” e lipoproteínas de alta densidade (HDL), frequentemente chamadas de “colesterol bom ”.

Os níveis de colesterol que são medidos por exames de sangue, refletem tanto o colesterol que produzimos, como o colesterol que ingerimos.

A grande maioria das pessoas, produz mais colesterol do que ingere.

O que acontece, é que o colesterol em maiores quantidades pode formar pequenos cristais, que são encontrados nas placas ateroscleróticas, que ficam em nossas artérias.[6]

Algumas células, como os macrófagos, que desempenham um papel imunológico extremamente importante, podem absorver esses cristais e ativar o inflamassoma NLRP3.[7]

Além disso, outros cristais como a sílica [8] e o ácido úrico[9], também são capazes de  desencadear essa ativação do inflamassoma.

Essa ativação do inflamassoma, por sua vez, desencadeia a liberação de várias citocinas pró-inflamatórias, incluindo IL-1beta e IL-18, que são capazes de promover a progressão da arteriosclerose, que basicamente é um processo de espessamento e obstrução nas artérias e gera diversas complicações graves como infarto e AVC. [10]

 

“A gema é composta principalmente de ácidos graxos, colesterol e nutrientes solúveis em gordura, mas apesar de ter menos proteínas do que a clara, ela contém concentrações mais elevadas de leucina, que é um aminoácidos essenciais mais importantes pro nosso organismo.”

DOENÇAS CARDIOVASCULARES

Estudos observacionais realizados em japoneses de meia-idade[11] e em pessoas com dieta mediterrânea [12] não encontraram associação entre o consumo de ovos e o risco de doenças cardiovasculares. 

Um outro estudo observacional realizado, não encontrou aumento no risco de acidente vascular cerebral ou doença arterial coronariana em pessoas que consomem de 1 a 6 ovos por semana[13][14] enquanto “mais de 6 ovos por semana” pareceu aumentar o risco de doença arterial coronariana apenas em indivíduos diabéticos.

Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo observacional em diabéticos que comparou pessoas que comem, pelo menos um ovo por semana com pessoas que não consomem nenhum ovo.[15]

Outro estudo realizado sobre o assunto, também não observou nenhuma conexão entre o consumo de ovos e doenças cardiovasculares, mas encontrou algumas associações consideráveis em diabéticos com relação ao consumo de ovos e o aumento da mortalidade dessas pessoas.[16]

 

“Estudos observacionais que examinam especificamente o consumo de ovos (em vez do colesterol da dieta geral) não descobriram que ele esteja associado a qualquer forma de doença cardiovascular, exceto talvez em indivíduos diabéticos.”

Embora os estudos observacionais possam sugerir uma ligação entre o consumo de ovos e doenças cardíacas em diabéticos, ensaios clínicos randomizados, que possuem um nível maior de evidência científica, não encontraram nenhuma ligação:

  • Em um estudo de 3 meses, 140 pessoas com diabetes ou pré-diabetes foram randomizadas para comer 2 ovos seis vezes por semana ou 2 ou menos ovos durante toda a semana. Nenhuma diferença em HDL, LDL, níveis de triglicerídeos ou controle glicêmico foi encontrada.[17]

  • Em um estudo cruzado randomizado de 5 semanas, 29 pessoas com diabetes tipo 2 consumiram no café da manhã 1 ovo com vegetais e pão ou meia xícara de aveia com leite. Nenhuma diferença na glicose plasmática, sensibilidade à insulina, pressão arterial, marcadores inflamatórios ou lipídios plasmáticos foi encontrada entre os períodos de ovo e aveia.[18]

  • Em um estudo de 12 semanas, 37 pessoas com diabetes tipo 2 e síndrome metabólica foram colocadas em uma dieta moderadamente restrita em carboidratos e, em seguida, divididas aleatoriamente entre dois grupos: um comendo 3 ovos inteiros por dia e o outro grupo, comendo apenas 3 claras por dia. Ambos os grupos perderam peso e viram melhorias na sensibilidade à insulina e em seus perfis lipídicos, mas o grupo que comeu o ovo inteiro apresentou uma melhoria maior em seus perfis lipídicos em alguns aspectos importantes: eles tinham mais HDL, menos VLDL e um perfil de diâmetro de LDL e HDL melhor do que o grupo que comeu somente as claras.[19]

     Uma análise de acompanhamento do mesmo estudo também encontrou mais melhorias nos marcadores de inflamação no grupo que comeu o ovo inteiro do que no grupo que consumiu apenas as claras.[20]

Da mesma forma, um estudo controlado de pacientes hiperlipidêmicos consumindo ovos (em relação a outras fontes dietéticas de colesterol e gordura) não associou nenhum efeito negativo ao consumo de ovos, embora a substituição dos ovos por proteína de ovo contendo nutrientes adicionados tenha sido considerada benéfica.[21]

Os fatores de risco também não pioraram em estudantes universitários saudáveis quando os ovos foram adicionados à dieta. Esses alunos foram randomizados para comer um café da manhã com 2 ovos ou sem ovos cinco vezes por semana durante 14 semanas.

De outra forma, eles podiam comer o que quisessem, embora as pessoas do grupo “sem ovos” fossem incentivadas a não comer nenhum ovo. Ao final do estudo, ambos os grupos ganharam peso e apresentaram piores perfis de lipídios no sangue, sem diferença significativa entre os grupos.[22]

“Em estudos controlados, seja em pessoas saudáveis ​​ou em pessoas que portadoras de diabetes ou hiperlipidemia, o consumo de ovos não foi associado a um aumento nos marcadores de risco para saúde cardiovascular, sensibilidade à insulina ou glicose sanguínea.”

DIABETES

Como podemos ver, as evidências observacionais podem sugerir uma ligação entre o consumo de ovos e doenças cardiovasculares em diabéticos. 

Evidências observacionais também podem sugerir uma ligação entre o consumo de ovos e o risco do desenvolvimento de diabetes. 

Em um estudo, os ovos na dieta (de “quase nunca” a “quase diariamente”) não parecem estar associados a um risco aumentado de desenvolver diabetes,[23] mas outros estudos observaram uma associação positiva, com os controles sendo educação, história familiar de diabetes e biomarcadores de linha de base para estados de doença (como triglicerídeos plasmáticos).[24] [25][26]

Por fim, dois estudos relataram uma associação mais forte do desenvolvimento de diabetes em mulheres do que em homens.[24][26]

EMAGRECIMENTO

População Saudável

Em um estudo randomizado de 14 semanas, realizado com estudantes universitários saudáveis divididos em dois grupos (um para comer 2 ovos cinco vezes por semana e outro sem comer nenhum ovo) ganharam peso na mesmas proporções.[22]

Diabéticos

Em um estudo de 12 semanas, dois grupos de diabéticos obesos iniciaram uma dieta para perder peso. Um grupo comeu 2 ovos por dia e o outro, nenhum. Ambos os grupos viram uma redução igual no LDL e no colesterol total, mas o grupo que comeu ovo apresentou um aumento maior no HDL (colesterol bom). Não houve diferença na pressão arterial ou na glicose sangüínea entre os dois grupos, mas a redução na insulina de jejum foi observada foi menor no grupo que comeu ovos.[27]

Em um estudo cruzado randomizado de 5 semanas, foi realizado com 29 pessoas com diabetes tipo 2. Elas consumiram no café da manhã 1 ovo com vegetais e pão ou meia xícara de aveia com leite. Como observamos anteriormente, nenhuma diferença na glicose plasmática, sensibilidade à insulina, pressão arterial, marcadores inflamatórios ou lipídios plasmáticos foi encontrada.

Nenhuma diferença no peso corporal, gordura corporal ou IMC foi encontrada.[18]

REFERÊNCIAS

  1. Ohman M, et al. Biochemical effects of consumption of eggs containing omega-3 polyunsaturated fatty acidsUps J Med Sci. (2008)
  2. Bovet P, et al. Decrease in blood triglycerides associated with the consumption of eggs of hens fed with food supplemented with fish oilNutr Metab Cardiovasc Dis. (2007)
  3. Goodrow EF, et al. Consumption of one egg per day increases serum lutein and zeaxanthin concentrations in older adults without altering serum lipid and lipoprotein cholesterol concentrationsJ Nutr. (2006)
  4. Vishwanathan R, et al. Consumption of 2 and 4 egg yolks/d for 5 wk increases macular pigment concentrations in older adults with low macular pigment taking cholesterol-lowering statinsAm J Clin Nutr. (2009)
  5.  Zeisel SH, da Costa KA. Choline: an essential nutrient for public healthNutr Rev. (2009)
  6. Small DM. George Lyman Duff memorial lecture. Progression and regression of atherosclerotic lesions. Insights from lipid physical biochemistryArteriosclerosis. (1988)
  7. Rajamäki K, et al. Cholesterol crystals activate the NLRP3 inflammasome in human macrophages: a novel link between cholesterol metabolism and inflammationPLoS One. (2010)
  8. Hornung V, et al. Silica crystals and aluminum salts have been shown to activate the inflammasome through phagosomal destabilizationNat Immunol. (2008)
  9. Martinon F, et al. Gout-associated uric acid crystals activate the NALP3 inflammasomeNature. (2006)
  10. Duewell P, et al. NLRP3 inflammasomes are required for atherogenesis and activated by cholesterol crystalsNature. (2010)
  11. Nakamura Y, et al. Egg consumption, serum total cholesterol concentrations and coronary heart disease incidence: Japan Public Health Center-based prospective studyBr J Nutr. (2006)
  12. Zazpe I, et al. Egg consumption and risk of cardiovascular disease in the SUN ProjectEur J Clin Nutr. (2011)
  13. Qureshi AI, et al. Regular egg consumption does not increase the risk of stroke and cardiovascular diseasesMed Sci Monit. (2007)
  14. Scrafford CG, et al. Egg consumption and CHD and stroke mortality: a prospective study of US adultsPublic Health Nutr. (2011)
  15. Hu FB, et al. A prospective study of egg consumption and risk of cardiovascular disease in men and womenJAMA. (1999)
  16. Djoussé L, Gaziano JM. Egg consumption in relation to cardiovascular disease and mortality: the Physicians’ Health StudyAm J Clin Nutr. (2008)
  17. Fuller NR, et al. The effect of a high-egg diet on cardiovascular risk factors in people with type 2 diabetes: the Diabetes and Egg (DIABEGG) study-a 3-mo randomized controlled trialAm J Clin Nutr. (2015)
  18. Ballesteros MN, et al. One Egg per Day Improves Inflammation when Compared to an Oatmeal-Based Breakfast without Increasing Other Cardiometabolic Risk Factors in Diabetic PatientsNutrients. (2015)
  19. Blesso CN, et al. Whole egg consumption improves lipoprotein profiles and insulin sensitivity to a greater extent than yolk-free egg substitute in individuals with metabolic syndromeMetabolism. (2013)
  20. Blesso CN, et al. Effects of carbohydrate restriction and dietary cholesterol provided by eggs on clinical risk factors in metabolic syndromeJ Clin Lipidol. (2013)
  21. Njike V, et al. Daily egg consumption in hyperlipidemic adults–effects on endothelial function and cardiovascular riskNutr J. (2010)
  22. Rueda JM, Khosla P. Impact of breakfasts (with or without eggs) on body weight regulation and blood lipids in university students over a 14-week semesterNutrients. (2013)
  23. Djoussé L, et al. Egg consumption and risk of type 2 diabetes in older adultsAm J Clin Nutr. (2010)
  24. Ra.dzevičienė L, Ostrauskas R. Egg consumption and the risk of type 2 diabetes mellitus: a case-control studyPublic Health Nutr. (2012)
  25. Djoussé L, et al. Egg consumption and risk of type 2 diabetes in men and womenDiabetes Care. (2009)
  26. Shi Z, et al. Egg consumption and the risk of diabetes in adults, Jiangsu, ChinaNutrition. (2011)
  27. Pearce KL, Clifton PM, Noakes M. Egg consumption as part of an energy-restricted high-protein diet improves blood lipid and blood glucose profiles in individuals with type 2 diabetesBr J Nutr. (2011)

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